segunda-feira, outubro 20, 2003
do fundo do baú da memória
Vou procurar e passar a escrito algumas das memórias que se encontram bem lá no fundo do baú onde guardamos recordações de situações vividas há muito ou que nos foram contadas pelos mais velhos. O pouco interesse que possam ter para os leitores dedicados pode bem ser compensado pelo afecto que pretendo colocar nesta partilha.
Um contador de histórias muito especial
O meu pai, o Manel da drogaria, era formado na universidade da vida. Tinha a quarta classe e fruto da sua actividade profissional era um especialista em cálculo mental, mas era, acima de tudo, um extraordinário contador de histórias.
O repertório poderia não ser muito vasto, mas havia algumas histórias que eu ouvia deliciado dezenas de vezes. Sempre que havia uma oportunidade lá estava eu: “Paizinho conta aquela história do...”. Ele sempre tratava de alterar um ou outro pormenor por forma a parecer uma nova história.
Estas histórias tinham como personagens pessoas conhecidas, vizinhos, colegas de trabalho, familiares, pelo que me sobrava sempre a dúvida se as histórias eram reais ou se seriam inventadas. Ainda hoje quando as relembro tenho a mesma dúvida.
Contava ele...
O teu avô, mestre Humberto sapateiro, quando tinha um novo aprendiz logo tratava de lhe encomendar um recado. “Olha vai ali ao mestre João (mestre do mesmo ofício) e diz-lhe que o mestre Humberto lhe pede emprestada a pedra de afiar as cerdas...” Lá seguia o aprendiz, expedito no seu caminhar na direcção da oficina do mestre João. O pior era quando regressava ajoujado com um enorme pedregulho que o mestre João sabedor do recado lhe enviava para o mestre Humberto.
Ou então...
O Negos, alcunha do marçano de tez bem queimada, lá juntara dinheiro da sua magra jorna para comprar umas botas para mandar para a terra, lá para os lados de Trás-os-Montes. Botas compradas havia que fazer o envio. “Ó Sô Manel agora como vou enviar as botas?” “Olha Negos! Sobes àquele poste telefónico, penduras as botas e dizes o endereço... Se os fios servem para fazer chegar a tua voz a Trás-os-Montes também farão chegar as botas”. E o pobre Negos lá subiu ao alto do poste telefónico, ainda mais, carregado com as botas.
Finalmente...
O abastado comerciante de loja de porta aberta quando o filho lhe pedia dinheiro, cinco tostões, para ir à festa de Caneças sempre lhe dizia “Toma lá os cinco tostões porque não quero que um filho meu faça más figuras junto dos amigos indo à festa sem dinheiro. Mas quando voltares quero cá de novo os cinco tostões...”
Temos que concordar que a vida era mais tranquila nesses tempos de antanho.
Um contador de histórias muito especial
O meu pai, o Manel da drogaria, era formado na universidade da vida. Tinha a quarta classe e fruto da sua actividade profissional era um especialista em cálculo mental, mas era, acima de tudo, um extraordinário contador de histórias.
O repertório poderia não ser muito vasto, mas havia algumas histórias que eu ouvia deliciado dezenas de vezes. Sempre que havia uma oportunidade lá estava eu: “Paizinho conta aquela história do...”. Ele sempre tratava de alterar um ou outro pormenor por forma a parecer uma nova história.
Estas histórias tinham como personagens pessoas conhecidas, vizinhos, colegas de trabalho, familiares, pelo que me sobrava sempre a dúvida se as histórias eram reais ou se seriam inventadas. Ainda hoje quando as relembro tenho a mesma dúvida.
Contava ele...
O teu avô, mestre Humberto sapateiro, quando tinha um novo aprendiz logo tratava de lhe encomendar um recado. “Olha vai ali ao mestre João (mestre do mesmo ofício) e diz-lhe que o mestre Humberto lhe pede emprestada a pedra de afiar as cerdas...” Lá seguia o aprendiz, expedito no seu caminhar na direcção da oficina do mestre João. O pior era quando regressava ajoujado com um enorme pedregulho que o mestre João sabedor do recado lhe enviava para o mestre Humberto.
Ou então...
O Negos, alcunha do marçano de tez bem queimada, lá juntara dinheiro da sua magra jorna para comprar umas botas para mandar para a terra, lá para os lados de Trás-os-Montes. Botas compradas havia que fazer o envio. “Ó Sô Manel agora como vou enviar as botas?” “Olha Negos! Sobes àquele poste telefónico, penduras as botas e dizes o endereço... Se os fios servem para fazer chegar a tua voz a Trás-os-Montes também farão chegar as botas”. E o pobre Negos lá subiu ao alto do poste telefónico, ainda mais, carregado com as botas.
Finalmente...
O abastado comerciante de loja de porta aberta quando o filho lhe pedia dinheiro, cinco tostões, para ir à festa de Caneças sempre lhe dizia “Toma lá os cinco tostões porque não quero que um filho meu faça más figuras junto dos amigos indo à festa sem dinheiro. Mas quando voltares quero cá de novo os cinco tostões...”
Temos que concordar que a vida era mais tranquila nesses tempos de antanho.