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terça-feira, outubro 21, 2003

do fundo do baú da memória

Vou procurar e passar a escrito algumas das memórias que se encontram bem lá no fundo do baú onde guardamos recordações de situações vividas há muito ou que nos foram contadas pelos mais velhos. O pouco interesse que possam ter para os leitores dedicados pode bem ser compensado pelo afecto que pretendo colocar nesta partilha.

Eu sou mais hóquei do que futebol

Portugal foi campeão do Mundo de hóquei em patins, na conclusão de longos dias de competição, pela segunda vez, num campeonato disputado em Montreux, na Suíça. Eu teria na época 4 anos de idade.

Foi uma euforia nacional. No ano anterior o campeonato do Mundo disputara-se em Lisboa e Portugal sagrara-se vencedor. No ano de 1948 o campeonato realizara-se em Montreux e contra os espanhóis os italianos e os suíços que jogavam em casa Portugal voltara a vencer. Era o segundo campeonato que se realizara depois do final da Guerra e Portugal voltou a vencer.

Recordo-me duma multidão imensa no aeroporto de Lisboa na espera dos jogadores e de eu estar às cavalitas do Saraiva, colega de emprego do meu pai, para melhor ver os que já, então, eram meus ídolos. Emídio Pinto, Raio, Edgar, Jesus Correia e Correia dos Santos.

Estes dois últimos, conhecidos pelos primos Correias, serviram de inspiração para a constituição de um duo, os primos Ferreiras, eu e o meu primo, que jogávamos hóquei na rua, sem patins, com uma bola arredondada a partir de um cubo de madeira e com sticks improvisados pela habilidade de carpinteiro do meu pai.

A imagem dos primos Correia, era para mim a imagem recorrente de um duo de heróis que tão alto haviam colocado a bandeira portuguesa por esse Mundo fora. Gigantes, mesmo, na minha imaginação de criança. Imagem que me acompanhou longos anos da minha vida.

Um dia mais tarde, vinte anos passados, conheci pessoalmente Correia dos Santos. Colega de empresa. Enquanto eu já avançava pelos caminhos da informática, ele era um modesto cobrador, que percorria a cidade a pé ou em transportes públicos, de cliente em cliente, efectuando as cobranças mensais.

Fiquei tremendamente chocado. Aquele que para mim e para o País tinha atingido o mais elevado nível na competição desportiva apresentava-se uma fraca figura, envelhecido, pouco considerado, ignorado na sua grandeza pela maioria das pessoas.

Só haviam passado vinte anos. Mais trinta e cinco anos passaram entretanto. Correia dos Santos já não está entre nós. Mas ainda me recordo do garbo com que em 1948 chegou ao Aeroporto de Lisboa, vindo de Montreux, campeão do Mundo de Hóquei em Patins.

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