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terça-feira, janeiro 18, 2005

estórias de outros tempos

Já aqui tenho escrito a importância que tem na nossa vida e na nossa formação integral, o PAI. Este facto só é, realmente, valorizado quando o PAI parte fisicamente, mantenha-se, embora, sempre no nosso pensar e sentir. Vem isto a propósito do hábito que meu PAI tinha de contar estórias. Estórias singelas, como eram os tempos de então. Tempos duros, mas eivados de alguma ingenuidade e singeleza que se tem vindo a perder.


Contava o meu PAI:

O meu avô, mestre Humberto, sapateiro de oficina montada, vindo para a Amadora dos lados de Campolide, de origem cigana, talvez, remendava e fazia de novo, sandálias e sapatos, para o que contava com cerca de quinze colaboradores, entre oficiais e aprendizes. Num parêntesis dizer que todos jantavam (hoje almoço) à mesma mesa onde se reuniam cerca de 35 pessoas por refeição, incluindo a minha avó e os filhos que trabalhavam noutras artes.

Então sempre que entrava para o grupo um novo aprendiz, tinha lugar um ritual de iniciação para gáudio dos que por lá já se encontravam. Era a praxe de recepção, fundamental para a entrosão com a equipa de trabalho.

Dizia então o mestre Humberto ao novato:
_Oh Zé... vai ali ao mestre Manuel (colega de profissão com oficina aberta a quase um quilómetro) e diz-lhe que o mestre Humberto lhe pede emprestada a pedra de afiar cerdas (pequenas pontas de pelo de cavalo, que serviam de guia ao pontear manual das peças de couro).

E lá ia o Zé em passo de corrida que havia que mostrar trabalho ao seu mestre e guia a partir de agora. Quando chegava esbaforido à oficina do mestre Manuel e fazia o pedido, este, matreiro, já sabia a resposta a dar.

_Leva lá esta pedra de afiar cerdas ao mestre Humberto, mas diz-lhe que ma devolva logo que possa, pois muita falta me faz. E colocava-lhe nas mãos um enorme calhau, sei lá de quantos quilos, que o Zé teria que levar ao seu mestre, agora em passo lento e arrastado.

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