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sábado, abril 29, 2006

o meu caderno de viagens

Pequenos apontamentos rabiscados num caderno de viagem e agora partilhados com os leitores. Os sítios, as gentes, os costumes e as curiosidades observados por quem gosta mais de viajar do que de fazer turismo


Caminhar nas palafitas

O Porto Palafita da Carrasqueira é formado por uma imensa rede de passadiços construídos de madeira , em forma precária e labiríntica, enterrada no lodo do sapal que entra pelo Rio Sado adentro. Estas improvisadas construções datam de há cerca de pouco mais de meia centena de anos e resultam da luta do homem contra o assoreamento do rio Sado.

A pesca praticada, quer nas valas do arroz, quer nos esteiros do rio Sado tiveram originalmente o objectivo, de numa base estritamente familiar, complementarem a alimentação com os recursos proporcionados pela pesca local.



Em conjunto com as cabanas, a que os locais dão a depreciativa designação de barracas, são a imagem de uma fixação humana que divide a sua actividade e o seu labor entre as tarefas do campo e as piscatórias. As tarefas eram sempre realizadas no âmbito familiar próprio do estilo de fixação das populações que deram origem à aldeia da Carrasqueira.

Nas terras conquistadas ao sapal, com o esforço árduo dos homens que enchiam lamelas com as lamas retiradas à pazada e das mulheres que as transportavam para construir barreiras de consolidação, cultivaram o feijão e, muito em especial, a batata doce cuja qualidade era muito apreciada.



As águas do rio Sado foram desde sempre exploradas em termos piscatórios, muito embora de início somente com o recurso a embarcações varinas, de forma sazonal, que na época do sável subiam quase até Alcácer do Sal. Os pescadores de Setúbal não tinham por hábito pescar no rio Sado, estando mais voltados para o mar.

Hoje em dia são utilizadas embarcações diversas, havendo sempre o cuidado de na maré baixa procurarem os canais mais fundos, por forma a não encalharem as embarcações no lodo que assoreou o rio.



Durante muitos anos os pescadores dedicaram-se à apanha de moluscos bivalves e de crustáceos que se refugiavam no lodo das margens do rio, mas muito rapidamente, talvez pela forma descontrolada da apanha se esgotaram. Depois foi a ostra e mais tarde o berbigão. A poluição do rio Sado intensificada nos anos 60 de século passado levou a que também esses bivalves desaparecessem do rio.

Actualmente, a pesca está reduzida aos chocos e à minhoca que é exportada para Espanha em grandes quantidades. Quanto ao choco, continua a ser um dos maiores atractivos dos modestos restaurantes da aldeia da Carrasqueira.



A actividade piscatória na Carrasqueira, tal como acontece com as agrícolas, continua a ter um cariz familiar, onde a mulher sempre acompanha o marido, pois os dois são necessários às tarefas a executar e não há qualquer hipótese de constituir companhas, pelo estilo de pesca que se pratica.

O Porto Palafita da Carrasqueira é um interessante sítio a visitar, pelo seu tipicismo e pela história de vida que envolve. Para tanto, chegados à Comporta vindos no barco que de Setúbal atravessa o rio Sado até Tróia, cortamos à esquerda na direcção do rio até chegarmos à Carrasqueira.




Recomendamos a leitura de um excelente trabalho escrito por Fernando Ribeiro Martins e Henrique Souto intitulado “Os Agricultores-Pescadores da Carrasqueira (Estuário do Sado): Um modo de Vida em extinção?”, publicado na revista Encontros (de Divulgação e Debate em Ciências Sociais), Porto

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