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domingo, janeiro 28, 2007

o ar que respiramos

A “coisa” passou-se de forma tão sub-reptícia que nem eu próprio me apercebi do acontecido na altura, embora se um modo geral costume andar atento a movimentos fora do comum. Os próprios órgãos da comunicação social sempre tão atentos a movimentos suspeitos de gente suspeita nada registaram. Mas não há qualquer dúvida de que o funesto acontecimento teve lugar.

Um número ainda hoje por determinar de perigosos ladrões, com cadastro suficientemente sujo para intimidarem a segurança de qualquer país, evadiu-se de um estabelecimento prisional de alta segurança sem deixar rasto. Na calada da noite ou em plena luz do Sol, quem sabe?, puseram-se a monte acoitados por protecção do exterior.

Transformaram o seu visual recorrendo aos melhores cabeleireiros e institutos de beleza e modificaram a forma de falar, que de gutural e bruta passou a ser suave e melodiosa. Ganharam maneiras e passaram a ser citados nas revistas cor-de-rosa sempre ávidas de gente emergente no “soçaiti”. Aprenderam a linguagem do Povo e com este se misturaram nas praças e nos mercados.

Ganharam a confiança das crianças, das mães e dos pais, do Povo português e ganharam muito mais coisas. Mantiveram-se tranquilamente nos postos e posições onde foram sendo colocados e onde, eles próprios, se colocaram. Colocaram muitos amigos em posições importantes e o tempo foi passando, esbatendo as arestas mais vivas dos acontecimentos.

Um dia o Povo, absorto em tantos acontecimentos estranhos que aconteciam à sua volta, privatizações, desemprego, falências, pedofilia, apercebeu-se que haviam desaparecido dois ou três euros que tinha no fundo do bolso. Havia sido roubado. Os órgãos da comunicação social eram ufanos em diariamente anunciarem que a segurança das pessoas aumentava a olhos vistos, que o crime diminuía neste Pais já de si de brandos costumes.

Daí para a frente os euros do Povo desapareciam mal ele se distraía. Até mesmo quando julgava estar atento. Os ladrões andavam à solta de novo, bem vestidos e bem falantes, mas ladrões. Roubaram o emprego ao Povo. Roubaram a saúde ao Povo. Roubaram a escola ao Povo. Segurança quanto menos melhor para que os ladrões actuassem sem entraves. É fartar a vilanagem.

Senhores bem vestidos, de fatos de alpaca, a maioria de tons cinzento, aplaudiam. Aplaudiam freneticamente. Felicitavam-se uns aos outros por terem salvo o País. Os lucros chorudos das suas empresas eram prova disso. Bancos, seguradoras, mas também as empresas das águas privadas que um dia já haviam sido públicas...

O próximo negócio que já foi aprovado pelos senhores do poder, para o qual se prepara a regulamentação provoca algumas disputas entre os grandes grupos financeiros. Mas eles ir-se-ão entender para bem da Nação. O ar que respiramos vai entrar na concorrência liberal... Vamos pagar o ar que respiramos, na certeza de que terá muito melhor qualidade.

[O Povo tomou consciência da sua própria força. Voltou a aprisionar os perigosos ladrões que se haviam evadido da prisão de alta segurança]

Comments:
Victor:

Hoje lanchei com o meu sogro em Viana do Castelo, numa cafetaria normalíssima. Paguei 4 euros por uma despesa que, antes da entrada do euro, me teria ficado, quando muito, por 2.50. Será que nestes poucos anos de vigência do euro tivemos uma inflacção tão alta que justifique este aumento de 37,5%?

E andamos nós com referendos a uma questão que podia ser resolvida na Assembleia da República com a poupança de milhares de euros...

Andam mesmo a roubar-nos por todos os lados...

Rui
 
Caro Rui.
Comentário como sempre enriquecedor do texto original. Com toda a razão nos comentários tecidos. Só não sei como a maioria dos portugueses continua a embarcar nestas turvas águas dos delapidadores de Portugal. Mas a "coisa" tem mesmo que mudar. Um abraço.
 
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