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terça-feira, outubro 27, 2009

estória de uma galena

tempos da rádio
na memória dos tempos aqui registo ao ritmo das recordações a minha breve incursão amadorística por territórios da radiodifusão, da telefonia e da telefonia sem fios, do encantamento da comunicação bidireccional e da interactividade entre o emissor e os ouvintes, os radiouvintes, como há época se dizia.




A galena do pai do meu tio Armando


Decorriam os anos 50 do século passado, talvez já iniciada a segunda metade da década, as férias de Verão, pelo menos parte significativa das mesmas, eram passadas numa aldeia da região Oeste de Portugal, terra de origem do meu ramo familiar materno: Fernandinho.

Tempos descuidados e sem preocupações passados nas correrias e brincadeiras próprias da miudagem de pouco mais de 10 anos de idade. Férias quase sempre acompanhado do meu primo Carlos, filho da irmã de minha mãe, em correrias de bicicletas e jogos do pião, do berlinde e tantos outros.

Sossegávamos e ficávamos embevecidos a olhar quando o avô do meu primo Carlos, antigo regedor da aldeia, se dispunha a mostrar-nos o seu baú de memórias e de saberes. Tocava banjo como ninguém e ficávamos horas a ouvi-lo tocar.

No entanto, aquilo que mais prendia a nossa atenção era uma aparelhómetro estranho a que ele chamava galena [*] ligado a um enorme fio de cobre esticado e com o qual depois de devidamente manipulado (sintonizado) nos possibilitava ouvir vozes e músicas, vindos sei lá de onde.

Apercebíamo-nos, contudo, que ele tinha algum cuidado para que do exterior da casa os passantes não se apercebessem do que estávamos a ouvir. Soube mais tarde, quando fui tendo consciência das coisas, que o Estado Novo punha muitas restrições à utilização destes equipamentos e que, mesmo naquela aldeia recôndita, os “escutas”, os bufos andavam sempre atentos.




[*] A galena foi inventada em 1906, quando um coronel do exército norte-americano, H. H. C. Dunwoody, patenteou o detector de cristal de sulfeto de chumbo natural (galena) que ligado a uma antena de fio de arame fino (bigode de gato) se transformava num receptor de emissões radiofónicas. Todo o som emitido pelo transmissor e captado pela antena, passava pelo cristal e era ouvido através de um par de auscultadores. As frequências emitidas eram sintonizadas no cristal ou pedra de galena, bastando para isso uma pequena variação na agulha.

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Comments:
E hoje ,hem Vicktor a tecnologia surpreende cada dia com mais novidades. Os minúsculos aparelhos celulares além de telefone, tocam músicas , fotografam , acessam internet,e sei lá mais o que. Estou aqui a teclar e serei lida a distancia e distancia , atravessando mares e que mares!! rsrs e se quisermos podemos falar em tempo real, online , podemos até nos vermos pela webcam, enfm o mundo desenvolveu , girando tanto que as vezes até assusta.
Gostei dessa historinha de uma galena. Talvez aqueles sons ouvidos já fosse o prenúncio do que , tanto poderia ser inventado no futuro que agora avistamos.Obrigada pela partilha.
meus abraços
 
Meu pai fez uma galena. Com um dínamo de bicicleta, e mais não sei que peças. Mas não dava som a não ser por auscultadores. Mesmo assim quando à noite ele ouvia, punha um copo com água em cima dela, porque diziam que o copo de água fazia com que ninguém soubesse que ali estava uma galena. Isto apesar de morarmos junto ao rio e não haver nenhuma habitação por perto. Mas ele tinha sempre esse cuidado e nunca cheguei a saber se havia uma explicação científica para isso ou se não passava de uma treta que alguém lhe contara.
Um abraço
 
Não conhecia a "galena" mas recordo o meu avô a ouvir "rádios clandestinas" num radiozito qualquer.
Mais tarde só ouviamos o que nos davam, mas faziam-se engenhocas para ouvir o que os "bufos pidescos" tentavam impedir!

Outros tempos que felizmente já passaram e mete-me raiva quando oiço por vezes os da minha geração: Salazar deveria voltar! Fogooooooo!!!!
 
Querida Lis

É bem verdade... cada vez são mais eficientes os meios de comunicação...

Mas já reparaste? Que as pessoas, na sua generalidade, tèm cada vez menos capacidade de comunicar entre si.

A comunicação total acabaria definitivamente com as guerras...

Beijinhos.
 
Querida Elvira

Era mesmo assim.... o som recebido pelas galenas somente era possível ser ouvido através de auscultadores.

Quanto ao copo de água tem razão de ser... absorve as ondas radiomagnéticas espúrias que eram as que eram possíveis de captar pelas "escutas" da PIDE.

Um beijinhos.
 
Querida Fatyly

Ainda hoje possuo a telefonia onde meu pai,e a família toda, ouvíamos as emissões da Rádio Moscovo, depois da meia-noite.

E todo o cuidado era pouco...

Beijinhos.
 
Mais uma estória interessante esta que nos conta. Não conhecia mas gostei. Bjs
 
Querida Sara

Fico contente por nos enriquecermos mutuamente.

Beijinhos.
 
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