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terça-feira, fevereiro 10, 2009

o homem da bicicleta

Começara a trabalhar muito menino. A aprender um ofício. Esse facto não iria impedir de continuar a ter que trabalhar nos campos, na ajuda ao pai e ao avô, pelo que o sol-a-sol estava marcado no seu destino de vida.

Exímio que já era a tratar dos animais de capoeira, das galinhas e dos coelhos, igualmente a conduzir a burrita com a qual ia até ao pinhal apanhar lenha e “pico” quando para tal tinha autorização, aprendia agora a arte de pedreiro.

A sua tenra idade pouco mais dava ainda do que para ser aguadeiro do mestre, dos pedreiros e dos serventes, mas a sua esperteza tornava-se cada vez mais aguçada no contacto com os mais velhos, homens calejados pelas agruras do trabalho diário.

Não sabia o que era um fim-de-semana, mas quem o saberia nessa época em que se trabalhava de sol-a-sol e os dias todos da semana? Nem o domingo, dia santo e de resguardo era tempo menos sobrecarregado de tarefas.

Não tinha muito a noção do tempo que passa, além do sol que marcava o dia e do escuro que a noite traçava e que era tempo de repouso. Mas na sua nascente esperteza ia apercebendo-se de algumas repetições, de alguns acontecimentos que pareciam verificar-se sempre em tempo certo.

Havia um tempo em que o mestre o mandava à fonte encher a bilha de água, independentemente da quantidade que ainda contivesse e que se apercebeu coincidir com o aparecimento lá longe de um homem de aspecto austero, boina na cabeça, que caminhava a ritmo certo levando à mão uma bicicleta de aspecto muito usado.

Além da coincidência desse homem passar naqueles dias que o mestre o mandava à fonte encher a bilha deu por si a pensar o que faria ali um homem com uma bicicleta em lugar tão ermo onde nem caminho havia para passantes.

A verdade é que quando regressava com a bilha da água, do homem da bicicleta nem sinal e o mestre parecia indiferente a qualquer acontecimento continuando no trabalho de assentar paredes da casa que estava a construir.

A curiosidade era tanta que um dia deixou a bilha na fonte e em correria por entre o mato e a coberto dos pinheiros existentes se aproximou furtivamente a tempo de ver o homem da bicicleta colocar algo debaixo de uma pedra e de se afastar rapidamente.

Não resistiu à tentação. Depois de ter voltado à fonte buscar a bilha da água e encontrando um momento de menos atenção do mestre foi a ver debaixo da pedra o que o homem da bicicleta lá tinha colocado.

A surpresa foi grande. Encontrou por lá somente uma folha de papel muito fino, dobrada várias vezes até formar um pequeno embrulho. Desdobrou-o cuidadosamente não pensando sequer como reporia tudo para que o mestre não se apercebesse da sua curiosidade.

As duas folhas de papel estavam completamente escritas, mais pareciam um jornal como os que estavam na taberna do sogro do Zé da Burra mas em ponto mais pequeno e em papel mais fino. Nada conseguiu ler, pois se ainda nem à escola tinha ido. Somente reconheceu num cantinho das folhas uma foice como a que a mãe usava para cortar o feno e um martelo igual aquele com que o pai martelava os pregos.

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